Eu poderia jurar que, depois de tantas, ela não voltaria ao assunto “namoro e afins”. Já vinha e com força total, num trololó que me deixava de cabelo
A excursão fazia parte do curso de férias. Sem ele, meu mês de julho tinha toda a chance de se tornar um inferno. Carola era “seca” numa rua. Por mais que eu tentasse segurá-la em casa ela se esquivava, dizendo que não era passarinho pra viver presa na gaiola. Então, mais uma vez e na tentativa de burlar sua intransigência, matriculei-a na escola já conhecida. Ela se distrairia e eu ficaria tranqüila, tocando meus afazeres.
A bendita programação incluía um passeio aqui pertinho da cidade, com piscinada, almoço campestre e atividades de lazer, de acordo com as dificuldades da moçada. Para fechar a temporada com a tranqüilidade reforçada, alguns monitores estariam presentes, garantindo a segurança e o entretenimento, sem perigo de sumiços e quedas. A assistência seria total. O cuidado, permanente. Tudo acertado em detalhes para que o dia fosse só alegria.
Carola voltou pra casa encantada com o Luizão. Quem é essa figura? – perguntava eu, já irritada com o andamento da prosa e o calor da emoção. Ela, esperta que só e sem ocultar o interesse, contava que ele fazia parte do grupo de apoio aos participantes da colônia de férias. Conversa vai, conversa vem, acabei descobrindo que o rapaz já era um homem feito e desconfiei, naturalmente, da bilateralidade do interesse.
Iniciei a sabatina com a certeza de que não chegaria a lugar algum. Ainda assim, disse a ela que o interesse não passava de um romance de verão. Que o rapaz poderia ser até muito bonzinho, e que o fato de tê-la tratado com carinho e atenção não justificava uma paixonite como aquela. Foi aí que ela me veio com a história de que o Luizão era um pouco moreninho, indagando se era por isso que eu não aprovava o namoro. Minhas justificativas foram insuficientes para convencê-la de que nada naquele episódio acabaria em boa coisa.
Preparei-me para os questionamentos vazios, sua pouca ou nenhuma boa vontade em entender minhas explicações e esperei pelo prejuízo. Resolvi investir num formato diferente, tentando, a partir disso, encurtar a distância entre o seu azedume e o meu bom senso. Com preguiça do que vinha contra mim, fiz questão de não questionar limites, propor reflexões, levantar questões: “desprogramei” meus padrões de crença. Fosse o que Deus quisesse!
Ela acordou cantando e passou a manhã inteira com uma música na cabeça. Tenho pra mim que aquela devia ser “a música do casal”. Será que, com o meu mutismo, eu inaugurava um novo tempo? Um tempo de trégua, de complacência amorosa, de paciência? Ou será que eu não havia percebido ainda que o velho, disfarçado de novo, reaparecia para me mostrar as mesmas coisas sob uma ótica diferente?
Naquela sua simplicidade infantil, bem distante de todas as minhas dúvidas e me relegando à condição de eterna coadjuvante, sentenciou:
- Mãe, eu pensei bastante essa noite e cheguei à conclusão de que não vou namorar o Luizão. Sabe lá se eu caso com ele e de repente a gente tem um monte de filhos, tudo xadrez? Ai, não quero não!
“O verdadeiro amor se modifica com o tempo, e cresce, e descobre novas maneiras de se expressar”.