quinta-feira, 27 de setembro de 2007

O início da síndrome do engano (1/3)

Não! Definitivamente não dava mais para encarar um horário livre todas as tardes, sem alguma ocupação. Além do mais, ficar solta na rua, andando de lá pra cá feito alma penada, era correr risco demais.

Carola cumpria à risca o currículo escolar, freqüentando assiduamente uma escola especial na parte da manhã. Mesmo assim, eu ainda achava que o horário vespertino estava desperdiçado. Ela precisava de mais estímulos, principalmente aqueles que lhe dessem a contrapartida do prazer.

Resolvida, busquei socorro com a especialista Iêda Fadul que, por essas obras do destino, acabou se tornando uma grande amiga. Assistente social, socióloga, professora dos cursos de Fisioterapia e Terapia Ocupacional da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais, entre outras atividades pertinentes, era reconhecida pelo trabalho magnífico que executava na identificação das potencialidades do deficiente.

Após uma bateria de exames que ajudaram na elaboração de um diagnóstico, foi-me indicada por ela uma oficina de artes. Era voltada para crianças com necessidades especiais como a minha e tinha o propósito de ensinar trabalhos manuais e de socializá-las em atividades lúdicas. Pinturas em telas, bordados em tapetes, ponto de cruz, jateados de vidros para compotas e garrafas d’água, além de uma série de outras técnicas, preencheriam o tempo de forma produtiva e alegre.

A idéia inicial me agradava demais. Eu só não conseguia enxergar como alguém com grandes dificuldades na área motora “fina” seria capaz de executar qualquer coisa minimamente razoável.

A visita à Oficina Germinarte foi marcada e sugeri a Iêda que me acompanhasse naquele périplo, já que, num primeiro momento, me vinha uma sensação muito ambígua. Alguma coisa que transitava entre uma ótima solução e uma grande aflição, mas que eu buscava ansiosamente.

Foi então que, feitas as apresentações de praxe, fiquei conhecendo pessoas interessantes e um novo espaço, que parecia me espreitar a cada porta aberta, a cada corredor transposto, a cada novo olhar que eu trocava. Instalações simples, limpas, recheadas de profissionais atenciosos e humanos. E alunos, por volta de uns quinze.

A diversidade do ser humano, especialmente nas suas fragilidades, me assustou.

Um comentário:

Anônimo disse...

"A diversidade do ser humano, especialmente nas suas fragilidades, me assustou."
Esse susto, pra nós (outros humanos) fez um bem danado. Esse seu contato com o "diverso" te deixou com um olhar pra vida e pra todos os nossos "defeitos" sem igual. Um olhar de compreensão, de paciência, de conhecimento, sabe? A Carola, com toda a sua "especialidade" TE fez ser um ser trés especial... Coisa rara!